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sexta-feira, 14 de maio de 2010

Amor público


Todos os apaixonados têm uma grande necessidade de demonstrar o amor que sentem um pelo outro publicamente. É só olhar para eles: estão sempre bem-humorados, de bem com a vida, com a cabeça no mundo da lua. Reconhecemos um apaixonado de longe.

E essa necessidade de divulgação de sentimentos começa bem cedo, já na escola. O caderno cheio de fórmulas matemáticas, mapas e ditados, e lá, na última página, um coração com as iniciais dos queridos, onde em baixo se lê “4ever”. O próximo passo é transpor esse coração para a casca da árvore do pátio do colégio. O seguinte, é gravar as iniciais no banco em que todos sentam no recreio. Mais além, o mesmo coração, talvez já com outra inicial, rabiscado na porta do banheiro.

Hoje, o virtual veio para contribuir com essa exposição. É preciso criar um perfil do casal no Orkut e rechear de fotos dos dois agarrados em todos os momentos. O nick do MSN deve vir com as iniciais dos pombinhos e o subnick com uma letra de música que expressa “exatamente” o que ambos estão sentindo. Sem esquecer os depoimentos no Orkut, que se tornaram declarações Ctrl+C + Ctrl+V de letras de música também.

O problema é que essa história deveria parar por aí. Porém, hoje, como a adolescência se “esticou”, algumas pessoas acabaram perdendo a noção do ridículo e ainda acham necessário propagar seus sentimentos aos quatro cantos. É por isso que, volta e meia, vemos um outdoor pedindo alguém em casamento ou com aquelas juras de amor eterno. Sem falar naqueles que mandam carros de tele-mensagem para envergonhar... digo, afirmar todo o seu amor. O recado é para ela, mas o bairro inteira fica sabendo. É o ápice da necessidade de divulgação.

Isso tudo tem a ver com a necessidade das pessoas, cada vez mais freqüente, de auto-afirmação. Parece que só seremos felizes se todo mundo souber que somos felizes. Felicidade a dois não existe mais. Hoje, é preciso “prestar contas” dos nossos sentimentos à sociedade. Ser “feliz para os outros” pode até ser bom por um tempo, mas logo perde a graça.

Doce ilusão. Na verdade, temos que dar satisfação para uma única pessoa: nós mesmos. Se não corrermos atrás da nossa felicidade, ninguém vai fazer isso por nós. Cada um tem o seu próprio ritmo e ninguém tem nada a ver com isso. Estamos nos desinteressando pela cumplicidade a dois; estamos esquecendo como é bom guardar segredos. Precisamos aprender a ser felizes na ausência também. O coração não precisa estar na ponta dos dedos.

3 comentários:

  1. Assino embaixo.
    Todo mundo hoje tem essa necessidade de mostrar que está feliz, para mim isso sempre pareceu muito falso. Devemos pensar mais na cimplcidade a dois, como você disse, do que nos outros. =D

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  2. Ah, essa cumplicidade! O que seria de uma relação sem ela?

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