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domingo, 28 de fevereiro de 2010

Situação


Situação um: Eles se conhecem e trocam telefones. Ele diz que vai ligar. Ela espera. Ele não liga. Ela parte pra outro.

Situação dois: Eles se conhecem e trocam telefones. Ele diz que vai ligar. Ela espera. Ele não liga. Ela continua esperando, torcendo, rezando, fazendo promessa. Ele liga. Ela vibra. Ele convida ela pra sair. Ela se faz de difícil, mas aceita. Ele só vai lembrar dela no final de semana, quando forem se encontrar. Ela começa uma maratona nos shoppings da cidade em busca de um vestido especial para usar no encontro. Ela compra muitas coisas que não está precisando. Ela gasta o que tem e o que não tem, até comprar o tal vestido especial. Ela está determinada, enfrenta lojas, provadores, filas e vendedores chatos. Ela paga muito caro por um sapato que vai machucar a noite inteira. Ela precisa de uma bolsa para combinar com o sapato. Ela marca um horário no salão. Ela tá nervosa. Ele está numa felicidade crescente.

Eles se encontram. Eles se amam. Eles se completam. Eles se casam. Eles se traem. Eles se separam. É muito mais fácil quando ele não liga pra ela.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Amor de praia


Como todo início de ano, tentamos cumprir as promessas do réveillon, sendo que a principal, geralmente, é a de arrumar um novo amor. Assim, vamos pra praia e passamos por cinco estágios de vida: o sonhador, o esperançoso, o experimental, o desesperador e o descobridor.

No primeiro, o sonhador, estamos entusiasmados com a possibilidade de encontrar alguém especial. Nos tornamos pessoas fáceis, de conversa agradável, usamos todos os nossos truques de conquista e não temos medo do que vem pela frente. De uma hora pra outra, nos tornamos pessoas confiantes e desfilamos pelas areias do litoral “avaliando” as possibilidades.

No segundo estágio, o esperançoso, algo mais palpável começa a surgir. Trocamos alguns telefones, dispensamos aqueles que nos pareceram impróprios, uma amiga apresentou um amigo, marcamos encontros mais sérios, trocamos alguns beijos e talvez até alguma coisa a mais. E, finalmente, fazemos a nossa escolha.

No terceiro estágio, o experimental, no qual colocamos à prova o nosso pretendente. Engatamos um romance de cinema, desfilamos de mãos dadas pelo calçadão, exibindo o querido e o bronzeado. O cenário ajuda, e a disposição para fazer dar certo também. É carinho pra lá, beijinho pra cá, felicidade geral.

Aí vem o quarto estágio, o desesperador, que é quando, um belo dia, acordamos e entramos em pânico ao perceber que tudo está dando muito certo. Desconfiamos que “tá bom demais pra ser verdade” e começamos a duvidar da lealdade do parceiro e - pra nossa tristeza – quase sempre estamos certos. Afinal de contas, é praia, e ninguém é de ninguém.

O quinto e último estágio, o descobridor, é aquele em que abrimos os olhos pra realidade, e vemos que arrumar um novo amor pro resto do ano é mais complicado do que parece, pois todo amor de verão vem junto com um pé-na-bunda de verão. É a hora em que, pensando bem, chegamos a conclusão de que ficar sozinho pode não ser tão ruim. Nos damos conta de que o amor de praia é passageiro, assim como a estação do verão, e que foi bom enquanto durou. Ano que vem tem mais.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Dica de leitura


Pra quem não sabe o que ler nas férias: O VERÃO E AS MULHERES, de Rubem Braga



“Chegou o verão, e há o que sempre houve: casais que estremecem, confusões conjugais e extra, ansiedade esparsa, caju e abacaxi, viagens bruscas, suaves delírios, telefonemas esquisitos, noitadas vãs. Tudo isso é o verão, e o verão é a verdade do sol. Queimam-se as mulheres. Umas se fazem cor de cobre, outras se doiram, em outras repontam discretamente sardas ao longo do corpo, como estrelas ao crepúsculo. Reparem bem esta comparação: é obviamente ruim mas é tipicamente de verão, e o verão em si não é mau, nem bom. É a nossa profunda, verdadeira verdade.”

Rubem Braga (1913-1990), o “sabiá da crônica” brasileira.


Aceito outras sugestões!

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

A praia dos gaúchos


Nós aqui do estado mais ao sul do Brasil temos muito bom humor, porque só assim para encarar o verão do nosso litoral, que está cada vez pior. Se já não bastasse as ondas cor chocolate, o vento que por pouco não nos leva junto, a permanente bandeira vermelha e os esgotos em direção ao mar, agora também temos ataques de tubarão e inúmeras águas-vivas. Realmente, é incrível a nossa capacidade de nos maravilharmos, todos os anos, com a nossa pobre costa: é o ônus de viver em meio à prédios no asfalto.

É de praxe, passamos o ano inteiro falando mal do nosso litoral e não nos cansamos de elogiar Camburiú, Canasvieras, Costão do Santinho ou Torres (que já consideramos como parte de Santa Catarina) nem de sonhar com Jurerê Internacional, mas não vemos a hora de pegar a freeway rumo Atlântida, Capão ou Tramandaí. Se bobear, não dispensamos nem Pinhal ou Cidreira. É nessa hora que deixamos de lado o nosso espaçoso lar e não nos importamos em dividir uma casa de dois quartos com outras doze pessoas; é nessa hora também que deixamos o nosso confortável lar para dormir em colchões velhos cheirando a mofo, dividindo-o com algum familiar ou amigo que se escalar de última hora para a praia. É nessa hora que pegamos a Estrada do Mar com o carro lotado, espremidos entre as tantas bagagens que provavelmente não vamos utilizar quando chegar ao destino; mesmo estando entre cinco pessoas dentro de um único veículo, é certo que vamos ouvir reclamações a respeito do preço do pedágio, que todo ano sobe, ignorando as boas condições da estrada. É nessa hora que não nos importamos em dormir em beliches – se tivermos sorte – nem em “acampar” no quintal alheio. Se bobear de novo, dormiríamos até na casinha do salva-vidas, sem reclamar. Essa é a época em que temos que aprender a conviver com aqueles mosquitos enormes e selvagens, ávidos por sangue novo, que atormentarão nossas noites, nem que seja somente com a cantoria, no caso de não esquecermos o repelente. Os outros problemas ficarão por conta dos altos preços da vida na praia: qualquer picolé não custará menos de cinco reais, nem um almoço à la carte, menos de trinta.

Apesar desses detalhes, achamos tudo muito divertido e não vemos a hora do verão voltar. É assim todo o ano, e será exatamente assim nos próximos, caso não haja possibilidade de umas FÉRIAS (sim, com letra maiúscula) fora daqui.