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segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Eternamente casado



Era uma vez um príncipe encantado. Ele vivia o início de sua vida adulta calmamente, acreditando estar fazendo tudo corretamente e no tempo certo. Era casado com a princesa mais inspiradora do reino, que vivia para satisfazer suas necessidades. Um homem de muita sorte, eu diria. O casal era bastante unido, o que os facilitava para superar os obstáculos que a vida lhes teimava em proporcionar. O reino que habitavam estava passando por uma forte crise, mas o príncipe tinha tirado a sorte grande: a sua princesa jamais o decepcionaria. Ela estava sempre lá, o apoiando nos momentos mais difíceis, segurando sua mão, zelando seu sono, falando palavras de incentivo, agüentando as intempéries do relacionamento. A princesa acreditava no príncipe.

Com o passar do tempo, podemos perceber que a princesa era boa demais para o príncipe. Ela era mais decidida, mais confiante, mais segura. Ele não soube lidar com isso. Como príncipe, achava que tinha a obrigação de ser o melhor de todos. Acreditava que ele é quem deveria cuidar da princesa, e não o contrário. Ele deveria ser a personalidade forte na relação, aquele quem protege o parceiro, aquele que sabe para onde ir sem precisar de mapa. Foi quando, em determinada dificuldade, o príncipe se descobriu em baixa e resolveu não aceitar mais essa situação.

Então, em um dia chuvoso, o príncipe acordou em crise. Resolveu ir embora de seu castelo, abandonando sua amada. Isso aconteceu porque ele não sabia ser feliz, não sabia que tinha tudo o que precisava para sobreviver e não sabia dar valor à princesa que tinha. O príncipe entrou em fase de separação. Não, não. Não houve fase de separação. Ele simplesmente abdicou da princesa de uma hora para outra. Brigou e foi embora. Se não pudesse ser pior, ele a deixou em um momento delicado da vida, como só uma pessoa muito egoísta e sem coração conseguiria fazer.

A partir daí, o príncipe se fechou no seu mundo particular. Abandonar a princesa foi a última atitude que ele conseguiu tomar na vida. Depois disso, nunca mais lutou pelo o que quis. Só arrumou desculpas e mais desculpas para evitar tomar decisões. O medo de errar rondava sua nova moradia. Ele começou a sofrer mais do que tinha imaginado e continuava a não admitir seus problemas. Ele era um príncipe, não podia dar o braço à torcer. Porque antes de ser casado com a princesa, ele era casado com seu orgulho. Assim, recusou todas as chances de se erguer que lhe foram oferecidas. Ignorou todos que tentaram acreditar no seu talento e lhe estender a mão. Porque também era casado com a sua arrogância.

Após a separação, ele também optou por renegar seus sentimentos. Não levava mais nenhum relacionamento à sério nem queria criar laços profundos com qualquer outra pessoa. Fugia na direção oposta, mesmo contra sua vontade. Não se permitia envolver com outras princesas. O príncipe estava traumatizado. E isso foi trazendo um cansaço quase existencial para ele. Tudo porque era casado com seu medo.

Ele não conseguia fazer ninguém feliz, porque era casado com a sua própria felicidade. Se preocupava unicamente com a sua felicidade, passando por cima de qualquer sentimento alheio. O que importava era ser feliz, mesmo que isso causasse sofrimento a quem estivesse por perto. Era casado com seu egoísmo. Sempre via defeito nos outros, mas nunca soube – nem se importava – em lidar com os seus.

Apesar de tudo, o príncipe não abriu mão do seu jeito galanteador. Dessa forma, foi se tornando um conquistador cada vez mais experiente. Tornou-se um homem da noite. Pelos reinos por onde passava, deixava as princesas suspirando enlouquecidamente. Muitas vezes chegou a ser motivo de briga entre elas, o que só aumentava seu deleite. Porque o príncipe também era casado com a Sra. Sedução.

O que o príncipe não sabia era o seu final. Ele tinha decidido que o tempo, que era uma das suas principais preocupações enquanto casado com a princesa, não era mais importante. Mal sabia ele o seu destino. Nunca desconfiou que um dia ele não seria o príncipe mais disputado do reino. Não imaginou que um dia a sua beleza poderia lhe abandonar. Nunca lhe passou pela cabeça que depois de tanto negar relacionamentos de verdade, só restariam os superficiais. Ele acabou se apegando a esses relacionamentos de mentira como se valessem grande coisa. E isso não vai mudar. Ele sozinho é incapaz de fazer tal alteração. Porque ainda vai fazer mais um casamento, provavelmente o último: com a soberba.

O final óbvio do príncipe nos leva a imaginar que ele vai acabar sem reino e sem trono. Meu sexto sentido diz que ele ainda vai acabar sem princesa. Vai ficar sem majestade e sem herdeiros. No final, esse príncipe vai virar sapo.

No conto de fada pós-moderno, o príncipe precisa ser salvo por uma princesa. Só que para ser salvo, ele precisa estar solteiro. No mínimo, divorciado.

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